"A disciplina antecede a espontaneidade." Emmanuel

29 junho, 2011

Ponte Aérea

A Ponte Aérea que liga as cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, é sem sombra de dúvidas um dos voos mais charmosos que existem. Certa vez efetuei um destes voos saindo bem cedinho de São Paulo. Era começo da primavera e o dia começava de maneira radiante. O céu de São Paulo estava limpo com o Sol surgindo no horizonte. O embarque transcorria de maneira tranquila.
Recepcionando recebendo nossos convidados à porta da aeronave, tentava imaginar o que se passava na cabeça de cada um deles. Desfilavam à minha frente, algumas personalidades muito conhecidas, atletas, executivos, magistrados, políticos. Vez por outra me indagavam sobre as condições de voo e o tempo no Rio. Nossa decolagem ocorreu no sentido do litoral pela pista 17R. Após o sobrevoo de Diadema, curvo a esquerda para interceptar a rota para o nosso destino. Sobrevoamos parte do vale do rio Paraíba, após breves 17 minutos de voo, desde a nossa decolagem, alcançamos a altitude de cruzeiro, cerca de 28.000 pés, já sobrevoando a cidade de Ubatuba, com condições atmosféricas favoráveis ao voo. Um verdadeiro céu de brigadeiro! Em virtude do fluxo intenso de aeronaves entre estas duas cidades o controle de tráfego aéreo é compartilhado pelos Controles de Tráfego Aéreo do Rio e de São Paulo. A duração do voo é de aproximadamente 38 minutos, exigindo da equipe de comissários esforço extra para a execução do serviço de bordo. Perto da linha do horizonte já diviso parte da geografia do Rio com a baía de Sepetiba a nossa frente, seguida pelo maciço da Tijuca que abriga uma belíssima vegetação de Mata Atlântica ainda preservada com um formato peculiar de um gigante adormecido. Iniciamos o procedimento de descida, deixando a nossa direita a Ilha Grande e a esquerda as cidades de Paraty e Angra dos Reis. A cor do mar é um espetáculo a parte! Com tonalidades indo desde o verde esmeralda até o azul celeste. Informo aos passageiros nosso horário de chegada e atualizo as condições meteorológicas do nosso destino. Ingressamos no procedimento que nos levará até o circuito de tráfego do aeroporto Santos Dumont. Sobrevoamos o campo dos Afonsos deixando o aeroporto Internacional a nossa esquerda. Um pouco mais a frente a igreja da Penha, o maior estádio do mundo, a Baía de Guanabara. Ao ingressar no circuito de tráfego que se inicia sobre o relógio da Central do Brasil, iniciamos a fase final de aproximação. Estendemos os flaps, o trem de pouso, reduzimos a aeronave para a velocidade final de aproximação. É chegada a parte mais delicada de todo o voo. São poucos os aeroportos no mundo que reúnem ao mesmo tempo um número tão grande de variáveis importantes que devem ser observadas atentamente pela tripulação a fim de garantir a condução segura do voo. O relevo acidentado próximo a nossa trajetória, uma quantidade sem fim de pássaros, helicópteros, aeronaves desportivas disputando o mesmo espaço aéreo, mudanças bruscas na direção e intensidade dos ventos e como grand finale os poucos metros de pista disponíveis para a aterrissagem. Exatos 1326 metros de concreto. Medida que confere ao aeroporto Santos Dumont o título de menor pista em que se operam aeronaves da família Airbus 320 no planeta. Neste dia tínhamos conosco na cabine um piloto de testes da Airbus, que efetuava uma auditoria de qualidade nas operações da empresa. Piloto experimentado, foi traído pela alteração das feições quando mostrei nosso objetivo. Parecia não acreditar que pousaríamos em tão pouco espaço; deduzi; pela forma como apertou seu cinto de segurança. Já configurados para pouso seguimos em direção a praia de Botafogo, donde interceptamos a curva base do circuito. Sobrevoamos o hospital IV Centenário a apenas 800 pés de altura. A nossa direita o Cristo Redentor de braços abertos abençoa nossa chegada. Curvamos a esquerda em descida contínua sobre a praia de Botafogo deixando os bondinhos do Pão de açúcar abaixo da linha de nossa asa direita. Quando interceptamos a aproximação final já estamos com 500 pés de altura, ao avistar a pequena extensão de concreto a nossa frente percebo que nosso ilustre convidado se contorce buscando melhor posição em seu assento. Seu semblante mostra a tensão de que era refém. Pousamos nossa bela máquina exatamente no alvo. A “marca de mil” (correspondente a 300 metros de pista a contar da cabeceira). Em pistas muito curtas está marca é o ponto decisivo entre a continuação do pouso ou uma arremetida mandatória, pelo simples fato de que o cumprimento restante de pista após este ponto pode não ser o suficiente para garantir a desaceleração da aeronave. Ao livrarmos a pista, observo um relaxamento de nosso convidado que, sorrindo meio sem graça pelo canto da boca comenta: “Trick runaway, Captain”. O que em nossa língua coloquialmente, seria: “Pistinha sem vergonha”. 

2 comentários:

  1. AMIGO VC ESTÁ IMPOSSÍVEL, PARABENS!!SE O ARMANDO NOGUEIRA ESTIVESSE ENTRE NÓS CERTAMENTE ELE TE CONVOCARIA PRA SUA SELEÇÃO DE CRONISTAS.ADOREI!
    UM FORTE ABRAÇO.

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  2. Combinação bem temperada de pensamentos e sentimentos que emocionam e enlevam.
    Nossos efusivos cumprimentos.

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